segunda-feira, 2 de abril de 2012

SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA DAS FAMÍLIAS APODIENSES AFRODESCENDENTES (I).

O  roteiro  bibliográfico  potiguar  atinente  ao  capítulo  da  HISTÓRIA  DA  ESCRAVIDÃO  NEGRA, e  em  especial  em terras  apodienses, revela  uma realidade  lacunosa, com  veementes  índícios  de  desdém  emoldurado  em  laivos  de  arraigado  e  insano  racismo.  Todavia, há  um  manancial  em  documentos  oficiais  existentes  nos  arquivos  cartoriais  e  livros  de  Assentos  de  Batizados  da  Igreja-Matriz, que  subsidiarão  os  poucos  e  abnegados  pesquisadores  que  venham  a  enveredar  por  esse  dolente  e  merencórico  capítulo da  história  do  sofrido  escravo  africano  em  nosso  estado.  Não  podemos  deixar  entregue  ao  esquecimento  a  história  desta  gente sofrida  que  veio  habitar  entre  nós, mesmo  que  de  forma  coercitiva, forçosa, mas  que  com  o  passar  do  tempo  adaptaram-se  e  fincaram  suas  raízes  neste  chão, caldeando  o  indômito  e  vigoroso  sangue  africano  com  o  de  índios  e  do  elemento  branco  colonizador.  Urge  o  tempo,  e  os  documentos  oficiais  que  retratam  de  forma  fidedigna  a  história  desta  brava  gente  está  se deteriorando   dia-á-dia, dominados  pelas  intempéries  e  pelo  assédio  de  cupins, insetos  e  ratos.  O  processo do  tempo  é  uma trama de  efeitos  e  causas, de  sorte  que  ainda  restam uns  poucos  abnegados  na  seara  deste  incompreendido  trabalho  empreendido  para  rasgar  a  cortina da  indiferença  dos  que  deveriam  lutar  pela  preservação  da  história.
No que  diz  respeito  aos  estudiosos  da  escravidão  negra  na  região  Oeste  potiguar, merece  relevo  as  celebradas  publicações  intituladas  "OS  ESCRAVOS  NA  HISTÓRIA  DE  MOSSORÓ", de  autoria de Nancy  Neyza  Wanderley  de  Oliveira  e  Sebastião  Vasconcelos  dos  Santos, editada  pela  Coleção  Mossoroense - Volume  CLXXI - ano  1981, e  a  não  menos  renomada  obra  "ESCRAVOS  DA  RIBEIRA  DO  APODI  SOB  A  ÓTICA  DOS  INVENTÁRIOS", de  autoria  da  Professora  Dra. Maria  Goretti  Medeiros, editada  pela  Coleção  Mossoroense - Vol. 844 - 1995.  Nestas  publicações, encontramos  fartas  referências  aos  escravos  de  Apodi, desde  a  parte  de  inventários, até  o  contexto da  venda  destes  para  a  praça  de  Mossoró, durante  o famigerado período  do  TRÁFICO  NEGREIRO  INTERPROVINCIAL.  Quando  o  Prof. JOAQUIM  MANOEL  CARNEIRO DA  CUNHA  BELTRÃO  aportou  em  Apodi  no  ano  de  1843,oriundo  de  Tracunhaém-PE, para  lecionar  na  escola  de primeiras  letras  na então  Vila, já trazia  consigo  escravos  para  fazer-lhes  companhia  e  prestarem  seus  serviços.  Ao  casar  em  Apodi  com a  Srita. MARIA  ANGÉLICA  BEZERRA  CAVALCANTI ,no ano  de  1845, a mesma  trouxe  consigo  a  escrava  Inocência Constância, nascida  em  1828, e que  pertencera  ao  seu  genitor  Domingos  Alves  Ferreira  Cavalcanti.  De  Inocência  nasceu  a  escravinha  SABINA  no  ano  de  1852. Como era  costumeiro  a  adoção  do  sobrenome  familiar  dos  seus  senhores, a  escravinha  passou  a  ser  conhecida como  SABINA  CONSTÂNCIA  BELTRÃO.  Desta  magnânima  SABINA  nasceu  LÚCIO, patriarca  da  laboriosa  e  honrada  família  apodiense  conhecida  como  "FAMÍLIA  DOS  LÚCIO".  Vejamos  a  íntegra  do  assento  do  registro  de  batizado  de  Lúcio, cujo  nome  civil  em  adulto  passou  a  ser  LÚCIO  AGOSTINHO DA  SILVA: Batizado  nº 1.349, fls. 102:  - LÚCIO, filho  natural  de  Sabina, escrava  de  Joaquim  Manoel  Carneiro  da  Cunha  Beltrão, nasceu aos quinze  de  Abril  de  mil  oitocentos  e  setenta  e  hum, foi  batizado por  mim solenemente  na  dita  Matriz  aos  vinte  e  três  do dito mês  e ano, foram padrinhos  Pedro  Alexandrino Gomes  Tavares e  Cândida  Generosa  de Góis  Nogueira, solteiros; do  que  para  constar  fiz este  termo  que  assino,  O  Vigário Antonio Dias  da  Cunha. (FONTE: Livro de Registro  de  Batizados  da  Igreja-Matriz  da  Paróquia  de  Apodi,fls. 102  - 1868-1875).
casarão senhorial  pertencente a
JOAQUIM MANOEL CARNEIRO DA CUNHA BELTRÃO
 Pela  sua  desenvoltura, sêo  Lúcio  chegou  a  exercer  a  função  de  Oficial  de  Justiça, tendo  casado  com  Petronila  Gomes da  Silva (Pichau) e  deram  origem a  numerosa  prole, composta  por  laboriosos  homens  e  mulheres  que  enriquecem a  geografia  humana  de  Apodi: FRANCISCA  PETRONILA  DA  SILVA; MARIA  NAZARÉ  DA  SILVA (Nem); RAIMUNDA  PETRONILA  DA  SILVA (Neguinha) casada  com  Manoel  Alves  de  Lima (Manoel  Gogó); MARIA  JOSÉ  DA  SILVA; JOANA  PETRONILA  DA  SILVA; ANTONIA PETRONILA  DA SILVA (Antonia  Lúcio); PEDRO  LÚCIO  DA  SILVA, casado com Joana,irmã de Birim de  Jacó, e que são os pais do saudoso FUXICO; RAIMUNDO LÚCIO DA  SILVA,conhecido  popularmente como  "Doutor  Nêgo", casado com Ana  de  Góis; SEBASTIÃO  LÚCIO  DA  SILVA (Tião  Lúcio dos Correios  e  Telégrafos) casado  com  Eugênia  Pereira, filha  de  Anastácio  Pereira; FRANCISCO  LÚCIO DA  SILVA, casado com  Raimunda, da  cidade  de  Martins-RN; ANTONIO  LÚCIO  DA  SILVA,(Toinho) casado com  Martinha, filha de  José  Lopes, do  sítio  Trapiá, sendo  certo  que Toinho  Lúcio/Martinha  são  os pais  de  João  de  Toinha, casado  com  Sebastiana  e  que  são pais de  Chico  Cabeção  e  Batista  e  Socorrinha; JOSÉ  LÚCIO  DA  SILVA  (Dedé)  que  casou  com  Maria  Tenório, filha de  Domingos  Tenório; JOÃO  LÚCIO  DA  SILVA, que  casou  com  Liduína, natural  da  Bolívia, sendo  certo que  João  foi  embora  para  a  Bolívia  e  nunca  mais  deu  notícias; JOÃO  AGOSTINHO  DA  SILVA (Solteiro).  
COM O LENÇO SOBRE A CABEÇA: A COZINHEIRA OFICIAL
 DA PARÓQUIA DO APODI DURANTE MAIS DE 30 ANOS -
 A SOLTEIRONA "NEM DE LÚCIO FOGUETEIRO"
,CUJO NOME CIVIL ERA MARIA NAZARÉ DA SILVA,
NASCIDA A (21.12.1918) E FALECIDA NO ANO DE (2007).
 "NEM" ERA FILHA LEGITIMA DE
LÚCIO AGOSTINHO DA SILVA E DE PICHAU
 (CASAL TRONCO DA FAMÍLIA DOS "LÚCIOS"). 
 Há  uma  curiosidade  de  identidade  de  cunho  afrodescendente  pelos  casamentos  de  dois  de  seus  filhos  com  descendentes  de  escravos: RAIMUNDA  LÚCIO  casou  com Manoel  Gogó, que  era  filho  de  Raimunda  Maria da  Conceição (Casada  com  Jovino  Gogó -Jovino  Braz de Lima), que por sua vez era filha do ex-escravo Belarmino  Gomes da  Costa, tronco  dos  "Belarmino".  PEDRO  LÚCIO  casou  com  JOANA  FELÍCIO, filha  do  ex-escravo  JACÓ  FELÍCIO  DE  OLIVEIRA, escravo  que  foi  de  Francisco da  Costa  Morais.   No próximo  artigo  faremos  abordagens  históricas  sobre  as  famílias  afrodescendentes  VALENTIM, BASÍLIO,BELARMINO,GAVIÃO,CEARÁ,AVELINO e  SIMÃO.



Por Marcos Pinto - HISTORIADOR APODIENSE.

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